O jantar

O jantar

– Quem canta mesmo aquela música da menina que tem a pose exata para fotografar? As mãos dela firmes em cima da mesa. O garfo e a faca continuam no mesmo lugar. Desde que viu aquilo, sabia que teria que fazer algo. Só não sabia como. E ele falava com um sorriso. Não notou. As mãos dele desenham no ar cada palavra. Aquele sobrenome esquisito deve ser mesmo italiano. O anel do dedo do meio da mão direita acompanha o…

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Costura perfeita

Costura perfeita

Ela queria simetria, era exigente assim. Se conseguia ao pregar os botões da camisa do pai, era só aplicar a mesma técnica nos olhos do gafanhoto. Deixou para costurar os dois depois do almoço, quando a luz era melhor na saleta de trabalho. Usou a fita métrica da mãe para ajustar as posições. Foi quando percebeu que, por serem menores do que botões, olhos exigiam mais sutileza. E as asas do gafanhoto atrapalhavam um pouco, não paravam, faziam cócegas na…

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Eu queria ser um guarda-chuva

Eu queria ser um guarda-chuva

Já me decidi, vou acompanhar esse senhor. Ele é fechado, não sorri, mas anda devagar, com dificuldade, não consegue fugir da chuva. E a vida teria sido mais simples se eu apenas tivesse protegido meus donos anteriores da chuva. Quando Jonas Hanway me criou, foi isso que ele sonhou para mim. Porém, fomos ridicularizados. Uma hora, perceberam que estavam errados e decidiram criar mais de mim para usar na chuva; todavia, quando isso aconteceu, meu criador já tinha morrido. E…

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A Istambul de Teresa

A Istambul de Teresa

Ué? Todo mundo naquele canto do mundo não era obrigado a usar burca? Então, cadê as outras mulheres cobertas da cabeça aos pés? Teresa parecia ser a única. O povo na Praça Taskim mesmo esqueceu que devia estar de burca. Riam dela por dentro, ela podia sentir. Droga, ela quase nunca saía de casa, mas amava a ideia de viajar. Arriscou-se a ir para Istambul com Umbra justamente porque, lá, ela poderia se cobrir e se sentir enturmada. Ninguém veria…

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A instalação

A instalação

84 potes de vidro dispostos em forma de pirâmide no centro da mesa. Foram algumas horas de trabalho, limpando um a um, tirando as manchas, secando, admirando os itens hermeticamente protegidos de sua coleção. A base desta pilha nova era quadrada, 7 por 7. Arturo acreditava que sete era o número da perfeição. E uma pirâmide com base 7 x 7 dava força à criação. (“Ter usado um número par de potes ajudou.”) Admirando sua obra, ele sentia a energia…

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Noite de pizza

Noite de pizza

“O de sempre” não bastava. Ainda que fosse o mesmo garçom toda vez, o pai e a mãe tinham que explicar que a pizza era de catupiry, mas sem molho. Isso, sem molho. Não, nem um pouquinho. A filha era muito peculiar quando se tratava de seus pratos. No caso da pizza de catupiry, tinha que ter o número certo de azeitonas (oito, uma para cada pedaço), tinha que ter orégano (pouco, para não matar o sabor), massa como toda…

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Medo de altura

Medo de altura

Só sentia o gelado. Os pés descalços na tábua flexível tão distante do chão não melhoravam os arrepios: prancha de metal, insensível, escorregadia e que parecia curvar mais do que deveria, querendo acelerar o processo do pulo, empurrando ele para fora, convidando para baixo. A sola do pé quase queimava de tanto frio, ele achava que ia grudar na tábua e pensava que isso não seria de todo ruim; se grudasse, não teria que saltar, não teria como, mas ele…

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Isso não vai virar costume

Isso não vai virar costume

Essa coisa de “eu”, “eu”, “eu” – o famoso mimimi. Não vai, prometo. Mas eu queria começar dizendo por que estou aqui. Escrever é terapêutico. E eu tenho, de verdade, um monte de rabiscos espalhados por aqui. Sofro, sem dúvida, de escrita crônica. Tudo vira um garrancho, uma anotação, uma ideia gritando no papel. Garrancho, aliás, não é força de expressão. Cara, minha letra é feia. Às vezes, nem eu entendo o que escrevi depois. Então, por que não guardar…

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